Como ficam as faltas de trabalhadores atingidos pelas enchentes?
Notícias • 16 de Maio de 2024
Desde a semana passada, milhares de gaúchos sofrem diretamente os impactos das enchentes no Rio Grande do Sul. Muitos precisaram deixar suas casas, e há aqueles que não conseguem chegar ao local de trabalho devido às inundações. Empresas foram destruídas ou estão inacessíveis em meio às águas das cheias. Diante deste cenário, muitos trabalhadores convivem com o medo de perder o emprego ou de sofrer punições devido às faltas. A advogada trabalhista Maria Eduarda do Carmo, que atua no escritório Ferraz dos Passos, explica que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não tem especificado como devem ser tratadas as ausências decorrentes de desastres naturais, o que pode ser definido por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho. “O trabalhador não pode sofrer punições como advertência, suspensão ou demissão por justa causa por esse motivo”, esclarece a advogada.
Jornal da Lei – Os trabalhadores que faltaram ao trabalho devido às enchentes no RS podem ter desconto no pagamento?
Maria Eduarda do Carmo – A CLT, em seu artigo 473, elenca as circunstâncias em que o empregado pode faltar ao trabalho sem prejuízo salarial, como falecimento do cônjuge, casamento, nascimento de filho, doação de sangue, entre outros. No entanto, não menciona explicitamente as enchentes como uma dessas situações.
Considerando a gravidade do desastre ambiental que assola o Rio Grande do Sul, as enchentes podem impedir o comparecimento do trabalhador ao serviço, caracterizando um caso de força maior, um evento alheio ao controle do empregado que o impede de cumprir suas obrigações contratuais.
Entretanto, sem uma previsão legal para afastamento remunerado, o trabalhador pode ter seus dias de falta por enchente descontados do salário, exigindo bom senso das partes envolvidas. É importante esclarecer que um acordo ou convenção coletiva de trabalho pode estabelecer o abono das faltas em tais situações, devendo ser cumprido tal determinação.
Por fim, é crucial ressaltar que, embora o dia possa ser descontado, o trabalhador não pode sofrer punições como advertência, suspensão ou demissão por justa causa por esse motivo.
JL – Quais os recursos que as empresas podem oferecer aos seus empregados diante da calamidade pública no estado do Rio Grande do Sul?
Maria Eduarda – As empresas podem adotar as seguintes medidas:
(1) Flexibilização de horários, permitindo ajustes para acomodar dificuldades de locomoção ou permitindo o trabalho remoto, quando possível.
(2) Adiantamentos salariais
(3) Flexibilidade na política de faltas, evitando descontos injustos nos salários.
JL – Quais os benefícios que os trabalhadores podem acessar?
Maria Eduarda – Os trabalhadores também têm acesso a benefícios que podem ajudar a enfrentar os impactos das enchentes. Eles podem requerer:
(1) Saque Calamidade do FGTS;
(2) Antecipação de benefícios previdenciários, conforme estabelecido na portaria conjunta INSS/MPS Nº 46, de 3 de maio de 2024.
(3) Prorrogação da data de entrega do Imposto de Renda.
JL – Dar férias coletivas é uma boa alternativa para os empresários que estão sendo impactados?
Maria Eduarda – Sim, inclusive a concessão das férias coletivas, prevista no artigo 139 da CLT, é uma alternativa viável para os empresários que foram impactados pelas cheias no Rio Grande do Sul, pois ajuda a reduzir custos enquanto a empresa enfrenta dificuldades temporárias.
JL – Muitas pessoas já estão dando sinais de abalos emocionais. É possível obter afastamento do trabalho por esse motivo? Como o funcionário deve proceder?
Maria Eduarda – O simples abalo emocional não implica automaticamente o afastamento do trabalho. O afastamento só será considerado se uma avaliação médica comprovar que existe um trauma que incapacita o indivíduo, mesmo que temporariamente, para realizar suas funções laborais.
Para iniciar o processo de afastamento, o trabalhador deve fornecer ao empregador um relatório médico detalhado, juntamente com atestados médicos que estipulem o tempo de incapacidade. Durante os primeiros 15 dias de afastamento, é responsabilidade da empresa arcar com os pagamentos ao funcionário. Após esse período, o empregado será encaminhado ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para agendar uma perícia médica. Durante o período de afastamento posterior ao décimo sexto dia, o pagamento será de responsabilidade do INSS.
JL – Temos visto nos últimos anos muitas tragédias climáticas. Cheias, barragens rompendo, incêndios florestais. Há algo na legislação voltado a isso no sentido de proteção para os trabalhadores nesses casos específicos?
Maria Eduarda – Atualmente, não há legislação com determinações específicas para proteger os trabalhadores em eventos climáticos extremos e desastres naturais, a situação permanece delicada.
No entanto, há a Lei nº 14.437, aprovada em agosto de 2022, que concede ao Poder Executivo Federal a autoridade para implementar medidas trabalhistas alternativas em cenários de calamidade pública. Essas medidas incluem a possibilidade de redução proporcional da jornada de trabalho e dos salários, ou até mesmo a suspensão temporária dos contratos de trabalho, mediante acordo entre empregador e empregado. Vale ressaltar que tais medidas foram adotadas durante a crise da pandemia de Covid-19.
Enquanto aguardamos a ação do poder executivo nesse sentido, no caso do Rio Grande do Sul, é importante destacar que a CLT, embora não trate diretamente de cada tipo de desastre, oferece alguns mecanismos que podem ser aplicados em situações adversas. Por exemplo, o artigo 502 da CLT assegura indenizações, em alguns casos, aos empregados no caso de extinção da empresa por força maior, enquanto o artigo 2º estabelece que os riscos das atividades econômicas são de responsabilidade do empregador.
Fonte: Jornal do Comércio
César Romeu Nazario
OAB/RS 17.832
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